29 de fevereiro de 2016

Opinião - "Cavaleiro de Copas" de Terrence Malick


Sinopse:
Um escritor (Christian Bale) leva uma vida de festas luxuosas, namoros curtos e relações pouco satisfatórias. Cansado deste ritmo, começa a reavaliar as suas escolhas, recordando as mulheres importantes na sua trajetória.
 
Opinião por Marta Nogueira
Ou se gosta de Terrence Malick, ou não. E quando se gosta, aprende-se rapidamente que é um gosto adquirido, como o vinho, as ostras, Prince, Jazz, Stanley Kubrick, James Joyce, Jackson Pollock ou todos os grandes génios artísticos.
É preciso aprender a gostar de uma cinematografia muito própria e única, cujas principais características são a corrente de pensamento, a montagem inovadora, a filosofia transmitida através das imagens mais do que pelo enredo, uma reverência pela natureza e a demonstração da insignificância da humanidade face ao ambiente que a rodeia. Os filmes de Malick são sempre belos, belos visualmente, belos sonoramente, belos sensorialmente poder-se-ia dizer, mesmo quando o que contam possa ser muito negro. Porque o feio, como aprendemos com as disciplinas artísticas, pode ombrear com o bonito quando falamos de beleza ou do sublime.
Este "Cavaleiro de Copas" conta a história de um homem que revê a sua vida enquanto se procura a si próprio e procura talvez um caminho ou um sentido perdido, o homem que queria ser quando era jovem e cujo rasto foi deixando escapar no turbilhão da sua vida pautada pelo sucesso, pelas festas, pelas mulheres, pelo dinheiro. O enredo divide-se em oito capítulos, sete dos quais têm nomes de cartas do tarot, tal como o título: A Lua, o Enforcado, O Eremita, Julgamento, A Torre, A Imperatriz, Morte e o último intitulado Liberdade. Cada capítulo mostra o relacionamento do protagonista Rick com pessoas que passaram pela sua vida, sobretudo mulheres, respectivamente, uma rebelde, o seu irmão e o seu pai, um playboy amoral, a sua ex-mulher, uma modelo, uma stripper, uma ex-namorada e, finalmente, uma inocente que lhe mostra o caminho.
Rick deambula pelo filme revisitando momentos, instantes do seu passado, tal e qual como fazemos quando relembramos pormenores das nossas vidas - nunca revivemos a cena inteira, mas pedaços desconectados, temporalmente baralhados às vezes, que nos marcaram mais do que outros pormenores corriqueiros. Diálogos, frases, discussões, toques, sensações, pensamentos.
O filme é Malick levado ao extremo, mas talvez demasiado ao extremo. A beleza das imagens é inegável, a técnica superior indiscutível, mas penso que Malick poderá estar a atingir um ponto de saturação e de repetição de si próprio, em que o visual se sobrepõe demasiado ao sentido do conteúdo, em detrimento completo deste último. Em que a forma passa a ser única e exclusiva, com cada vez menos contacto com a substância. Malick perde-se na apoteose imagética e Christian Bale, tal como a sua personagem, é completamente arrastado e perdido neste turbilhão visual que de surreal nada tem mas que acaba por ser tão simbólico que se torna uma espécie de pastiche de Malick por Malick. E quando um artista começa a olhar demasiado para o próprio umbigo, o resultado costuma começar a deixar a desejar. Ou se calhar sou eu que preciso de rever o filme mais vezes e de o aprender.
Ilustrativo disto é uma conferência de imprensa em que Christian Bale e Natalie Portman são inquiridos sobre o significado do filme e das suas personagens e se perdem em rodeios quase anedóticos para tentarem explicar algo que eles próprios admitem não ter percebido completamente.
Visualmente brilhante. Mas Malick não é (ainda, nunca?) um Stanley Kubrick, decididamente.

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