27 de março de 2015

Opinião - O Dia dos Prodígios - Lídia Jorge


Título: O Dia dos Prodígios
Autora: Lídia Jorge 
Editora: Dom Quixote

Sinopse: 
O Dia dos Prodígios (1980), o primeiro romance de Lídia Jorge, foi um importante acontecimento literário, inaugurando uma nova fase, de grande qualidade, na literatura portuguesa.
Ocupando um lugar especial na ficção do pós 25 de Abril, este livro único conta-nos a história da coincidência da misteriosa morte de uma cobra numa pequena localidade com a revolução - a comunidade, incapaz de reconhecer a realidade política, adapta a chegada de soldados com cravos nos canos das armas ao seu mundo imaginário mágico-mítico. 

Opinião por André Daniel Silva: 
Este livro sem dúvida que me dividiu…No início a história não me prendeu e o estilo de escrita não é fácil de entender, o que exige uma atenção redobrada na leitura. Nunca tinha lido nenhuma obra de Lídia Jorge e confesso que numa primeira fase não foi fácil gostar do livro.
Depois, com o decorrer da leitura comecei a sentir-me mais dentro da história e consegui compreender melhor o estilo de escrita da autora. Comecei então a gostar da história, que após algum tempo de habituação acaba por ser "entranhada". Aqui cito Fernando Pessoa com a célebre frase “primeiro estranha-se, depois entranha-se” e assim foi.
Nesta obra a história gira em torno da população de Vilamaninhos, uma pequena aldeia algarvia, onde os seus habitantes expõem as suas práticas diárias, bem como os seus costumes sociais. As histórias mirabolantes são recorrentes em toda a história, pois pouco havia a fazer no dia-a-dia, a população era escassa e as casas em número muito baixo. Assim, a vida dos habitantes desta pequena povoação é o ponto principal da obra.
Como pontos fortes deste livro destaco a interessante interacção entre os habitantes de Vilamaninhos que sem dúvida expunham aquilo que Portugal era no pré-25 de Abril de 1974. A mesquinhez, a coscuvilhice e o "diz que disse" estiveram presentes ao longo de toda a obra, daí representar quase fielmente a sociedade portuguesa na década de 70, sobretudo numa aldeia pequena (algarvia) como era o caso da fictícia Vilamaninhos.
Pontos fracos elejo os diálogos em demasia (quase toda a história se centra em diálogos) e os blocos que podem gerar confusão no leitor. Confesso que em determinadas alturas nem percebia em que ponto estava tal o emaranhado de diálogos com que me deparava. A pontuação também não facilitava a leitura e aconselho a quem queira ler esta obra que se prepare para uma pontuação estranha e que pode gerar confusão.
A oralidade presente na obra contribui também para que depois de “entrarmos” mesmo na história sirva para nos sentirmos como parte do diálogo e até dá vontade de interagir com as personagens e também entrar na história. Há personagens fascinantes com as quais nos podemos identificar, uns pelo seu humor, outros pelas suas histórias e até há uma personagem particular que podemos vir a odiar (José Pássaro).
Neste livro está representada a típica aldeia onde pouco se faz e onde a principal actividade é a agricultura. Poucas casas e bastante pobreza também foram visíveis ao logo da obra. A taberna de Matilde era o local onde a aldeia se reunia para falarem uns dos outros (bem e mal) e onde tudo o que se passava na aldeia era relatado.
Várias famílias foram relatadas ao longo da obra e quase todas elas tinham histórias comuns e com as quais nos identificamos. Destaco Carminha (a protagonista da história), uma rapariga simples e sonhadora, cujo grande sonho era arranjar marido que a levasse para uma vida melhor. Assuntos, como a violência doméstica, o alcoolismo, o medo da mudança e do que é moderno percorreram toda a trama.
A obra apresenta um aspecto muito interessante que se centra no facto de as histórias fantásticas que aconteceram serem mirabolantes e poderem ser entendidas como prenúncio de uma nova Sociedade que estava para vir em que a democracia iria reinar, neste caso tendo por base a Revolução dos Cravos.
Quase no final da obra é possível verificar a chegada de soldados a Vilamaninhos o que representava a chegada da liberdade, pois o 25 de Abril já tinha acontecido.
No final, uma mensagem ecoou na minha cabeça e acredito que essa tinha sido a intenção principal de Lídia Jorge na construção desta obra, o futuro de cada um está nas suas mãos e não à mercê de quaisquer sinais ou fenómenos mais ou menos incomuns que o destino nos coloque na frente que era aquilo em que os habitantes de Vilamaninhos acreditavam.
Em suma, recomendo a obra, mas preparem-se para o estilo de escrita que não é fácil de suportar e entender. A obra é curta, cerca de 220 páginas, portanto podemos ler rapidamente. Se pudesse atribuir uma classificação de 0 a 5, atribuiria 4.

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